11.01.2008

Como me anda me faltando vontade para escrever aqui, vou postar um texto antigo sobre educação.



Sobre a fúria capitalista, Marx e a construção de robôs
O descaso com a educação justifica o destino de um país que vive sempre à espera de um futuro melhor

A falência do sistema educacional brasileiro já não é novidade para ninguém. Não só as escolas públicas sofrem desse mal, também as particulares precisam se submeter à exigências antiquadas e o pior: ministrar conteúdo de forma mecânica para alunos interessados em apenas passar de ano ou obter aprovação na difícil prova do vestibular. Padecendo por motivos diversos, as escolas brasileiras se arrastam em modelos há muito superados pelos países desenvolvidos, e aí que entram em debate as escolas presentes nos acampamentos dos Sem-Terra.
Com modelos de ensino totalmente diferentes, os professores ensinam já na educação infantil o pensamento de Marx, o modelo norte-americano de economia, o tão sonhado modelo socialista, a vida de Che Guevara. As aulas acontecem em qualquer lugar propício do acampamento: em baixo da copa de árvores, em tendas montadas com lona; e são adaptadas à realidade de cada espaço. Não há copa, nem cozinheiras, o lanche é plantado e colhido pelos alunos. Parece perfeito, mas não é.
A grande maioria dessas instituições de ensino são reconhecidas pelo governo e recebem investimentos das secretarias de educação, que também são responsáveis pelo pagamento dos salários dos professores e, logicamente, pelo "controle de qualidade". No entanto, essas escolas, que contam com 150 mil alunos espalhados pelo Brasil, não obedecem à Lei de Diretrizes e Bases da Educação e, não raro, empregam professores que nem chegaram ao ensino médio. As secretarias de educação usam a frágil desculpa de que é quase impossível fiscalizar todas as escolas; enquanto que os Sem-Terra alegam que precisam de educadores interessados no modelo de vida e no futuro do movimento.
Os Sem -Terrinha, como são chamados os alunos, defendem ferrenhamente suas escolas, acreditam que o sistema utilizado é muito melhor que das escolas urbanas e ainda relatam experiências de preconceito com professores e alunos de fora do acampamento. No início, é impossível pensar de forma contrária, com crianças de cinco anos que dissertam sobre Marx e explicam a ALCA. Mas com o conhecimento maior desse sistema educacional, é possível perceber as inúmeras falhas, a mais grave: parcialidade.
As crianças aprendem em canções e gritos de guerra que burgueses não prestam, que alimentos transgênicos têm veneno, que com o "R" e o "A" do alfabeto se escreve Reforma Agrária, e, se reclamam do preconceito sofrido nas grandes cidades, é porque não tem noção do preconceito que nutrem dos burgueses. Os educadores atuantes nessas escolas cometem um erro gravíssimo, criam robôs a serviço da revolução que talvez nunca ocorra. Os alunos não têm consciência, eles apenas repetem o que é dito todos os dias e concordam com tudo porque não conhecem o outro lado. Mas quem dera esse problema fosse só das escolas do MST.
Nas cidades grandes, em escolas públicas ou particulares, desde a infância, os alunos são bombardeados de conteúdo, precisam cumprir o programa exigido por lei em tempo hábil. Chegam à adolescência manipulados pela televisão, com sonhos de consumo próprios da sociedade estadunidense. Os mais abastados se trancam em cursinhos preparatórios para o vestibular, enquanto que os desfavorecidos abandonam a escola por um emprego de garçom ou secretária. Os vestibulandos se acham muito inteligentes porque conhecem história brasileira e sabem falar corretamente o português. Os jovens trabalhadores se lamentam do destino e sonham em ser um "burguês". O que ambos não sabem é que chegaram a essa idade sem saber quase nada: conhecem diferentes pensamentos, todos os motivos da II Guerra Mundial, mas não conseguem dissertar ou defender nenhum. São também robôs a serviço de nada.
As escolas urbanas usam o frágil argumento de que não há tempo para incentivar debates, de que os alunos precisam conhecer o programa a ser cobrado no vestibular, aquele exigido pela Lei, que atividades paralelas são desenvolvidas para ajudar na formação de cidadãos, mas não conseguem precisar exatamente quais. As escolas do MST usam o frágil argumento de que precisam formar cidadãos dispostos a lutar pelo movimento, pela justiça social. E o MEC, usa de todos os argumentos para justificar os inúmeros erros de um sistema falido.
Revolução mesmo precisa o sistema educacional brasileiro, mas isso levaria muito tempo para governos interessados sempre em medidas paliativas. Se não tem jeito, resta mesmo é aderir às políticas de redução de danos e acreditar que, se a escola pública regular não consegue chegar ao acampamento do MST, que permaneça, então, aquela que pode oferecer alguma educação; e se as escolas urbanas, por falta de interesse, pouco tempo ou necessidade capitalista, não formam cidadãos, que possam, pelo menos, preparar futuros universitários.